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Em alta no Brasil, condomínio residencial nasceu na Roma Antiga para pobre morar

Na antiga civilização, a formação de condomínios já era uma indústria, com direito à especulação imobiliária e inflação dos aluguéis, nada muito diferente do que é praticado hoje no Brasil

Quem vê hoje os avanços nos condomínios residenciais das grandes cidades brasileiras, com direito a espaço influencer, elevador para delivery de comida e tomada para carro elétrico não imagina que esse tipo de empreendimento nasceu na Roma Antiga. Eram as ínsulas, as habitações coletivas alugadas pela população mais pobre.

Segundo registros históricos, por volta do século 4 d.C., havia até 46 mil insulae (plural de ínsula) na “Cidade Eterna”, muito mais numerosos que as “domus”, as mansões dos nobres, que não chegavam a 2.000. O nome ínsula remete à “ilha” e era usado para denominar os quarteirões, considerados ilhas entre as ruas.

Na Roma Antiga, a formação de condomínios já era uma indústria, com direito à especulação imobiliária e inflação dos aluguéis, nada muito diferente do que é praticado hoje no Brasil. Ao contrário dos atuais condomínios, porém, quanto mais alto o apartamento, pior: não havia elevador, nem água ou esgoto nos últimos andares.

Conforme se chegava mais perto do solo, as instalações aumentavam de tamanho, conforto e preço. Não raro, os apartamentos do primeiro pavimento eram ocupados pelos donos da ínsula. Já no térreo costumavam funcionar os comércios.

Andrea Loewen, professora do Departamento de História da Arquitetura e Estética do Projeto da FAU-USP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo), ressalta que Roma foi a capital do mundo ocidental, trazendo influências importantes para além do direito, da língua, das artes e do governo. “Os romanos eram exímios construtores, tanto que seu legado na engenharia e na arquitetura resiste até hoje”, diz Andrea, doutora em História e Fundamentos da Arquitetura e do Urbanismo.

As ínsulas, porém, não eram o melhor exemplo de engenharia romana. “Elas eram construídas com materiais precários, as fundações não eram sólidas. O telhado era de madeira. Costumavam ser feitos ‘puxadinhos’, aumentando o número de pavimentos. Infelizmente, os desmoronamentos e incêndios eram muito comuns”, afirma a especialista.

O pouco cuidado com a segurança está relacionado ao milenar preconceito de classe: os moradores das ínsulas eram os plebeus, pescadores, os trabalhadores braçais e soldados. Muito diferente das domus, ocupadas por nobres, ricos comerciantes ou altos comandantes do exército romano, diz ela.

As ínsulas surgiram entre o fim da República e o início do Império Romano (27 a.C.). “Era preciso arranjar espaço para moradia em uma cidade que ia ficando cada vez mais densa. Por volta do século 2 d.C., os registros citam 1 milhão de habitantes dentro da muralha que cercava a cidade”, afirma Andrea. “Foram construções que cresceram até a queda do Império Romano, no século 4 d.C.”

No térreo da ínsula, voltados para a rua, ficavam os comércios e tabernas. Havia um grande pátio interno – o correspondente à área comum dos atuais condomínios – onde poderiam instalados um pequeno jardim, uma fonte de água e um pequeno templo.

A ligação entre os pavimentos era feita por meio de escadas de madeira. Em geral, as ínsulas tinham quatro andares. Mas houve época em que chegaram a ter nove pavimentos. Diante da precariedade e do risco das construções, foi imposto o limite de 20 metros de altura às edificações.

VIDA ERA NA RUA E ÍNSULA OFERECIA CUBÍCULO PARA DORMIR

As famílias dos donos das ínsulas, ou os inquilinos com mais recursos, moravam no primeiro pavimento, abastecido com água e esgoto. Os demais apartamentos não contavam com o mesmo conforto. “Eram cubículos, onde as pessoas iam para dormir. A vida era na rua, no espaço público: o trabalho, a comida, os banhos, os jogos”, diz Andrea.

Considerando que os lançamentos imobiliários são cada vez menores, nada muito diferente da vida nas grandes metrópoles do século 21. De acordo com dados do Secovi-SP (sindicato das construtoras do estado de São Paulo), 78% dos lançamentos residenciais na região hoje têm até 50 metros quadrados. Em 2004, essa metragem correspondia a apenas 12% dos lançamentos.

Por definição, um condomínio é um tipo de moradia em que várias unidades habitacionais (apartamentos, casas, lotes) são de propriedade individual, mas as áreas comuns, como jardins, piscinas, áreas de lazer e infraestrutura de segurança, são de propriedade coletiva e compartilhada entre os moradores.

As pessoas buscam a vida em condomínio pela segurança (sistemas de vigilância e controle de acesso), conforto (piscina, academia, churrasqueira, quadra e salão de festas no mesmo espaço) e, mais recentemente, conveniência: mercadinhos, lavanderia, limpeza profissional e lavagem de carros são cada vez mais comuns.

Na opinião de Marcio Rachkorsky, advogado especialista em condomínios, a evolução dos empreendimentos permitiu aos moradores terem acesso a uma série de opções de lazer e serviços, que até poucas décadas atrás não era possível. “Hoje existe um micromundo dentro de um condomínio, mesmo nos empreendimentos mais econômicos”, diz.

Segundo ele, o Brasil é um dos países onde mais existem condomínios de grande porte –com 10 a 20 torres reunidas em um mesmo lugar. “Os condomínios se tornaram organismos vivos, contratam muita gente, movimentam muito dinheiro, assim como uma empresa. Os brasileiros se acostumaram a ter alguém cuidando de tudo”, diz. “No exterior, os moradores costumam ser mais independentes e os condomínios têm menos funcionários.”

EXCESSO DE CONVENIÊNCIA PODE AUMENTAR SEGREGAÇÃO SOCIAL

Ter à mão um minimercado, lavanderia coletiva e até feira livre pode ser muito conveniente quando se trata de metrópoles e os problemas de deslocamento associados a elas. “Mas isso também impede uma integração com a vida urbana, a cidade, a comunidade ao redor”, diz Andrea. “É como se as pessoas vivessem em ilhas, mas diferentemente das ínsulas romanas, inseridas em meio à cidade, nos condomínios de hoje evita-se o compartilhar, em geral por questões de segurança.”

O resultado deste comportamento é que o cidadão não vive a cidade, não a ocupa, restringe sua vivência aos espaços privados que considera seguros, e com isso a segregação social aumenta, afirma.

Para Rachkorsky, o pior nos condomínios é a falta de vizinhança genuína entre moradores. “Tem muita gente que não se cumprimenta e faz questão de não participar da vida social. São pessoas que escolheram morar em uma coletividade, mas se negam a participar de uma assembleia, de um evento como um bazar”, diz.

Segundo ele, depois de melhorar tanto a infraestrutura, resta aos condomínios favorecer a integração entre os moradores. “Agora o desafio é muito mais comportamental, para que as pessoas não se isolem.”

Há uma tendência no mercado imobiliário nacional de transformar os condomínios em mini cidades. Com incentivos de legislações municipais para condomínios de uso misto, ou seja, com unidades para moradia e para comércio num mesmo terreno, diversos lançamentos que estimulam a integração entre pessoas e o urbanismo do entorno.

Projetos enquadrados pelo Minha Casa, Minha Vida, para famílias com renda a partir de R$ 3.000, chegam a 4.000 apartamentos em um único condomínio. Construir mais de uma torre num mesmo condomínio e com oferta de espaços para diferentes necessidades e segmentos de mercado é uma das formas de as incorporadoras viabilizarem seus empreendimentos.

“Só com volume conseguimos ter uma economia de escala”, afirma Ricardo Zylberman, da Magik LZ Empreendimentos, que está lançando um condomínio único com 1.800 apartamentos de até 34 m² na Penha, zona leste da capital paulista.

Fonte:

otempo.com.br

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